Thursday, July 05, 2007

Era dos descartáveis.

Numa sociedade onde o consumismo desenfreado e o capitalismo rolam soltos, a indústria de bens de consumo não-duráveis cresce cada vez mais. Hoje tudo é descartável, tudo mesmo, até marido, esposa, namorado, namorada, amigo, amiga, pais e por aí vai. O costume de usar e depois que não lhe é mais útil, jogar fora, tomou proporções absurdas, e nós seres humanos estamos virando produtos, que após bem manuseados, bem explorados, tornam-se inutilizáveis ao olho alheio.
Amar alguém não é mais o ponto decisivo para se namorar ou casar. Mais do que nunca aspectos como conveniência, status social e econômico, compatibilidade genética, atributos físicos, entre outros, determinam se a pessoa deve, ou não, amarrar-se a alguém. Se acontecer de existir amor, esse então é um plus, um brinde, que nem sempre é bem vindo. E pode esquecer o eternamente, o até que a morte os separe. A indústria de bens de consumo não-duráveis deixa bem claro que se estragou, joga fora e compra outro, não vale à pena tentar arrumar ou remendar, é mais fácil arranjar outro novinho em folha.
A amizade não é mais como costumava ser. É difícil achar amizades de longa data, daquelas que vinha da infância a vida adulta, porque querendo ou não, essas são difíceis de manter, e as pessoas parecem não estar dispostas a fazer tal esforço. O tempo passa e os caminhos a seguir são distintos, fica muito mais fácil arranjar novos amigos à medida que se avança na vida e na profissão, do que ficar tentando coincidir horários e lugares, numa tentativa de não perder aquela amizade antiga. Há também aquelas amizades que se faz quando necessário, seja pelo fato do amigo ter um carro, ou ser prestativo, ou possuir alguma qualidade interessante para o outro no momento. Então agita-se antes de usar, e usa-se a vontade, até a hora que cansar ou o interesse desaparecer, e dá-se um pé na bunda bem dado seguido de uma desculpa esfarrapada que não engana nem padre.
No que diz respeito aos pais, para mim é uma via de mão dupla, uma faca de dois gumes, que me choca a cada minuto. Filhos, quando bem querem, descartam os pais como se estes fossem chiclete, que depois de bem mastigado, perde o gosto e vai direto para o lixo. Esquece-se do provável sacrifício feito pelos progenitores, da longa espera durante nove meses, do amor muitas vezes dado sem qualquer retorno. Do mesmo jeito que pais largam seus filhos, seja logo após nascer, em alguma lixeira, num rio, na porta de alguém; ou a qualquer outro momento, é só o filho causar uma “grande decepção” que muitos pais pegam seus carros e vão embora, sem olhar para trás, sem qualquer ressentimento.
Existem tantas outras coisas que hoje em dia são descartáveis. No momento estou escrevendo isto num computador que o dia que estragar, valerá mais a pena comprar outro, estou ouvindo musica num tocador de música que se parar de funcionar não tem conserto, só adquirindo um novo. Pensamentos são descartáveis, sentimentos também. Até natureza é tida erroneamente por alguns como descartável. E infelizmente não há nada para fazer, a não ser aos poucos tentar chamar a atenção de pessoas para esse fato preocupante presente na sociedade em que vivemos, ou valer-se daquilo que dizem que tudo que um dia foi moda, volta a ser, ou seja, um dia os princípios de antigamente voltarão. Talvez assim o individualismo dê uma trégua. E a maldita indústria de bens de consumo não-duráveis entre em declínio até desaparecer totalmente. E eu e você deixaremos de ser descartáveis.